Um sonho não realizado
- Auro Valizi
- 14 de out.
- 4 min de leitura
A oportunidade de ouro perdida pela dupla Valizi & Valizinho
(Por Zé Valizi)
Desde o ano de 1952, a dupla “Valizi & Valizinho”, formada por mim e pelo meu irmão Osvaldo (em memória), se apresentava regularmente aos domingos no programa de auditório “Brasil Sertanejo”, da Rádio Cultura (Ituverava-SP). E como tínhamos muita vontade de seguir na carreira artística, queríamos ir para São Paulo, cantar numa rádio da capital, através da qual poderíamos conseguir projeção nacional.

Então, o nosso pai (Júlio Valisi) comentou com o senhor Herbaldo Martins (pai do compositor ituveravense Vitor Martins) sobre esse nosso desejo. O senhor Herbaldo conversou com o senhor Benedito Trajano Borges, que era fazendeiro, e este pediu para que nós o procurássemos. O Benedito Trajano havia se tornado amigo do então deputado estadual Condeixa Filho, e escreveu uma carta ao deputado recomendando a nossa dupla e pedindo que o deputado nos ajudasse a ingressar em uma emissora.
Com a carta em mão, partimos para São Paulo-SP em janeiro de 1958. Como não conhecíamos aquela cidade, o nosso primo Osvaldo Maniero (da cidade de Franca-SP), que já havia morado na capital paulista, acompanhou-nos na viagem até a Assembleia Legislativa. Lá chegando, o deputado Condeixa Filho nos recebeu e entregamos a ele a carta de recomendação. Ele a leu e nos perguntou em qual rádio a gente gostaria de ingressar. Dissemos que gostávamos muito da Rádio Nacional, porque nela havia um programa matinal do qual gostávamos muito. O deputado disse que na Rádio Nacional seria difícil, mas que ele poderia nos recomendar à Rádio Bandeirantes.
Assim, ele escreveu e nos entregou uma outra carta, recomendando-nos àquela emissora. Chegamos lá no dia seguinte e fomos recebidos pelo João Saad. Ele leu a carta e nos disse que não poderia deixar de atender ao pedido do deputado. O Saad disse-nos que, por ele, já poderíamos nos considerar ingressados na Bandeirantes, mas que existiam muitas duplas esperando uma oportunidade na emissora e que, portanto, ele não poderia passar por cima do diretor artístico-sertanejo da emissora, que era o Zacarias Mourão.
Mais tarde, o Zacarias Mourão nos recebeu. Quando adentramos a sala dele, onde eram realizados os testes, ele nos olhou e falou que a gente não lhe parecia ser estranhos; que ele tinha a impressão de já nos conhecer de algum lugar. Então lembramos-lhe que certa vez ele tinha ido a Ituverava acompanhando o Duo Estrela Dalva, que se apresentara num circo, num sábado à noite, e que no domingo o duo foi também se apresentar no programa Brasil Sertanejo, da Rádio Cultura, onde ele viu a nossa dupla se apresentar também.
Ele se recordou daquela ocasião e nos disse que nem precisávamos passar pelo teste, pois ele já tinha visto a nossa apresentação em Ituverava e que conhecia a qualidade da nossa dupla. Disse-nos ainda que estava prestes a lançar um novo programa, no qual o Duo Estrela Dalva iria se apresentar, e que iria nos encaixar no programa, para nos apresentarmos três vezes na semana. O programa estava previsto para estrear no mês seguinte, em fevereiro de 1958.
Enquanto aguardávamos o dia da nossa estreia no programa, ficamos hospedados em São Paulo, e todos os dias de manhã íamos assistir ao programa “Na Serra da Mantiqueira”, apresentado pelo Biguá, no auditório da Rádio Bandeirantes.
Faltando poucos dias para a nossa estreia na Bandeirantes, eis que o Valizinho (meu irmão e companheiro de dupla) adoeceu. Pegou uma forte gripe asiática e o médico recomendou que, devido ao clima desfavorável da capital paulista, seria melhor que ele voltasse para o interior, para se recuperar mais rapidamente.
Além do problema de saúde do Valizinho, recebemos uma carta de uma de nossas irmãs relatando que, desde que havíamos ido para a capital, a nossa mãe estava muito triste com a nossa ausência; que ela não se conformava de estarmos tão longe da família, e que não dormia direito e não vinha se alimentando bem. Diante do estado de saúde do Valizinho e das notícias sobre a nossa mãe, decidimos que o melhor naquele momento seria retornarmos para Ituverava.
Falamos com o Zacarias Mourão; ele compreendeu a situação, mas ressaltou que estaríamos abrindo mão de uma oportunidade de ouro. Mas que se quiséssemos voltar depois de alguns meses, nosso lugar no programa estaria garantido. E assim, faltando poucos dias para a nossa estreia na Rádio Bandeirantes, voltamos para casa e não mais retornamos à capital para usufruirmos daquela grande oportunidade. Acredito que se não fossem as circunstâncias desfavoráveis daquele momento e tivéssemos estreado no programa, teríamos conseguido a projeção e o reconhecimento artístico tão sonhado.
Mas quis o destino, se é que assim podemos dizer, me presentear, três anos mais tarde, com a oportunidade de apresentar um programa na Rádio Cultura de Ituverava: o “Fazendinha do Valizi”, que durante quatro décadas alegrou várias gerações, tornando-se um marco na minha vida e na história radiofônica de Ituverava.
Fonte: publicado originalmente em “Fazendinha do Valizi – Memórias de José Valizi”, edição 03, março/2015; revisado em outubro/2025.





Comentários